segunda-feira, 6 de julho de 2009

Reflexões sobre o Diaconato permanente (Reginaldo Marcelo)

Reginaldo Marcelo
Reflexões sobre o Diaconato permanente
Instituto Anglicano de Estudos Teológicos – IAET
2008


Introdução


Servir ao mundo é a tarefa primordial da igreja de Jesus Cristo. Rev Triana afirma em seu texto apresentado no Jornada teológica do IAET – 2008 – “Espiritualidade, Missão e Diakonia” que: a diaconia é a própria identidade da igreja e que se é discípulo ou discípula na medida em que se é servidor ou servidora e por isso, toda a tarefa de dedicação ao evangelho é diaconia, desde a missão, até a edificação e o cuidado da comunidade.


Para a igreja cumprir sua tarefa diaconal, Deus chama a todos os/as batizados/as, sem distinção de sexo ou etnia, para resgatar a humanidade e criação da escravidão e da morte e assim conceder vida em abundância.


Mesmo vocacionando a todos/ as batizados/as em sua tarefa de servir ao mundo, a Igreja ordena em nome de Cristo, pela invocação do Espírito Santo e imposição de mãos, alguns de seus membros para exercer os ministérios de Bispo/a, Presbítero/a e Diácono/a, estes são servos/as entre os servos/as. “Este, como todos os outros, é um ministério no serviço de Deus, e no serviço da igreja, corpo de Cristo. É um ministério chamado por Deus por causa de sua igreja, ‘para preparar o povo de Deus para o serviço cristão, a fim de construir o corpo de Cristo’ (Ef 4.13)” ( O Ministério Cristão – Guia de Estudos – ASTE, p.18).
Dentre os três ministérios ordenados, esse trabalho terá o humilde papel de refletir sobre o Diaconato, pois a Igreja, o mundo e humanidade têm a necessidade de pessoas que sintam-se chamadas para esse ministério em caráter permanente. Deve-se trazer à memória que esta Ordem (a diaconal) exerce as funções de servir aos pobres, desvalidos, doentes e solitários, como se fazendo ao próprio Cristo, ao bispo/a e presbítero/a, ler o Evangelho nas celebrações eucarísticas, servir as mesas, batizar e “exercer qualquer outro ofício sob o cuidado e orientação do/a bispo/a ou presbitério/a” (LOC – 1950 .p.533).


Para efetuarmos a tarefa reflexiva, dividiremos este trabalho da seguinte maneira:
- Todos/as os/as são chamados a servir: Este tópico procuraremos demonstrar que todas as pessoas que receberam o santo batismo são chamadas por Deus e sua Igreja para aplicar seus dons em forma de ministérios em prol de toda a Igreja, humanidade e mundo.
- A Igreja ordena alguns membros para o Santo Ministério: Nessa parte, procuraremos lembrar que todos os batizados são vocacionados, porém alguns membros são ordenados com imposição de mãos
- As ordens reconhecidas pela IEAB: Nesse item demonstraremos quais são as ordens reconhecidas pela IEAB, a saber: Bispo/a, Presbítero/a e Diácono/a;
- O diaconato no Atos dos Apóstolos: Trabalharemos o capítulo sexto dos Atos dos Apóstolos e a disputa entre os de fala grega e aramaica, porque as viúvas dos primeiros não eram atendidas em suas necessidades e assim a Assembléia Geral reunida escolheu sete homens para servir as mesas.
- Quais as funções e deveres do Diácono/a Permanente: A partir da Didaqué e do Rito Anglicano para a Ordenação ao Diaconato tentaremos pensar quais são as funções e deveres do diácono;
- Quais os ministérios específicos que o Diácono Permanente pode desenvolver: Nesse item procuraremos elencar quais são os ministérios específicos que o diácono/a pode desenvolver.
Procuramos embasar a maior parte de nossa pesquisa, em referências bibliográficas anglicanas e ecumênicas, assim como em autores anglicanos.


Todos os batizados são chamados a servir (exercer ministérios)
Todas as pessoas que receberam o Santo Batismo são chamadas a servir ao próximo com seus dons e tem a oportunidade de se colocar a serviço da Santa Igreja para exercer ministérios. Leandro Antunes Campos, clérigo anglicano na cidade de Santos – SP, em sua Monografia de conclusão do curso de teologia: Ministério do/a Diácono/a : “Na perspectiva do ordinal do Livro de Oração Comum”, citando o Relatório de Virgínia, afirma:


A todos aqueles que são batizados na vida de Deus e buscam viver em suas vidas o chamado como membros da Comunhão Anglicana é dado o carisma do Espírito Santo para a vida em comunhão e para o serviço dos outros. A vocação do povo Laos, é exercitada em um amplo contexto de vida social e pública na sociedade civil, no trabalho, no lazer dentro da família, assim como dentro da vida da comunidade da Igreja. Em virtude do batismo, todos os membros são chamados a confessar sua fé e prestar conta de sua esperança no que fazem e dizem (p.3)


A igreja ordena alguns membros para o Santo Ministério
A igreja reconhece que todos os batizados são vocacionados para o serviço (Diaconia), porém ela ordena alguns de seus membros para o ministério: em nome de Cristo, pela invocação do Espírito e imposição das mãos. É importante salientar que o chamado é para todos e todas, pois a Igreja Episcopal Anglicana do Brasil ordena homens e mulheres para as Sagradas Ordens, por acreditar que Deus não faz acepção de pessoas seja relativo a sexo, etnia ou inclinação sexual. Os Cânones Gerais da IEAB atestam: “Todos os cânones que mencionarem as ordens de ministério passam a incluir homens e mulheres” (Capítulo V, Cânon 2, artigo 1º, Cânones Gerais - 2000).


As ordens reconhecidas pela IAEB


O Novo Testamento não descreve uma única forma de ministério que deveria servir como norma duradoura para todo o ministério futuro da Igreja, pois no Novo Testamento aparece uma variedade de formas que existiam em diferentes lugares e tempos, porém durante os séculos II e III a igreja estabeleceu o tríplice ministério ordenado, do quais a IEAB aceita em seu seio: O Bispo, o Presbítero e o Diácono/a, cada um desempenhando uma função fundamental para que a comunidade de fé responda ao chamado de Cristo: O Relatório de Virgínia apresenta para os papéis desempenhados por cada um deles


O chamado de um bispo é para representar Cristo e a sua Igreja, especialmente como apóstolo, sacerdote líder, professor e pastor de uma diocese, para guardar a fé, unidade e disciplina de toda a Igreja, para proclamar a palavra de Deus, agir em nome de Cristo para a reconciliação do mundo e a construção da igreja e ordenar outros para continuar o ministério de Cristo.


O chamado de um sacerdote ou presbítero é para representar Cristo e sua Igreja, especialmente como pastor para o povo, compartilhar com os bispos a supervisão da Igreja, proclamar o Evangelho, ministrar os sacramentos e abençoar e declarar perdão em nome de Deus.
O chamado de um Diácono/a é para representar Cristo e sua Igreja, especialmente como servo daqueles que necessitam, ajudar bispos e sacerdotes na proclamação do Evangelho e no ministérios dos sacramentos. (p.18)


O Relatório de Virgínia ainda afirma que o ministério ordenado é exercido com, em e entre todo o povo de Deus (p.18). É importante lembrar que os ministros ordenados são servos/as entre os/as servos/as.
Diaconato Permanente


Nesse trabalho queremos ressaltar o papel específico do diaconato permanente, pois há necessidade de pessoas que desejem servir a Santa Igreja, a sociedade civil, os doentes e desfavorecidos como Diácono/as permanentes.


Muitas vezes, o diaconato tem sido visto simplesmente como um trampolim para o presbiterato, o que descaracteriza o papel do Diácono/a, visto que há uma carência de pessoas com esse perfil para servir o mundo em amor caridoso, misericórdia e assim apresentar um Deus que realmente preocupa-se e age em prol do ser humano.
O diaconato nasceu porque os necessitados, nesse caso viúvas, estavam sendo esquecidas no atendimento diário (na distribuição diária de dinheiro - NTLH).


O diaconato no Atos dos Apóstolos


O capítulo sexto de Atos dos Apóstolos é palco de uma disputa que se desenvolveu na Igreja de Jerusalém entre os cristãos de origem grega e os de origem hebraica. Os primeiros queixavam-se que as viúvas de seu grupo estavam sendo esquecidas no atendimento diário e não supridas em suas necessidades, porém a controvérsia pode ser maior do que aparenta.


Segundo Leandro Campos
(…) parece tratar de um simples problema social, os recursos não estavam sendo distribuídos de maneira justa. Mais profundamente, é possível que se veja nessa história que algo mais importante do que um almoço grátis, está em questão. A estas refeições eram incluídas algumas leituras e ensinamentos, portanto, a conversão era crucial para as viúvas de fala grega.


Diante do problema de organização interna, os Doze convocam uma assembléia geral para examinar a questão e chegar a uma decisão plausível e tornar suficiente a partilha dos bens em favor das viúvas. Os apóstolos estavam apreensivos, porque perceberam que a sua prioridade era ministério da Palavra, ou seja, deviam viajar, pregar e batizar para que o amor de Deus, expresso em Jesus Cristo chegasse ao maior número de pessoas.


Para resolver o conflito, a Assembléia Geral escolheu sete homens “de boa fama, repletos do Espírito Santo e de Sabedoria” (At 6.3). Estes sete primeiros diáconos tinham a função de “servir às mesas” ou seja atender as necessidades daquelas viúvas. O que segundo Leandro A. Campos “podia muito bem significar não apenas a refeição, mas também o anúncio das boas novas, da palavra que era pregada nas reuniões públicas, da partilha na oração e no entendimento da fé” . Os textos de Atos dizem que Estevão, o primeiro mártir cristão, pregava “fazia grandes prodígios e sinais entre o povo” (At 6.8) e Filipe explicou as Escrituras para o Eunuco e logo depois o batizou.


É fundamental lembrar que Diácono vem da palavra grega Diakonos, que significa um servo ou ajudante, o que se aplica ao Diácono/a ordenado pela Santa Igreja com imposição das mãos, pois ele tem inerente a si a função de auxiliar o bispo ou presbítero e servir ao mundo com seu ministério.


Quais as funções e deveres do Diácono/a permanente
A Didaqué, texto compilado entre os anos 90-100, na Síria, na Palestina ou em Antioquia, estabelece algumas diretrizes para a escolha do bispo e diácono: “escolhei-vos, pois, bispos e diáconos dignos do Senhor, homens dóceis, desprendidos, verazes e firmes, pois eles também exercerão entre vós a liturgia dos profetas e doutores”


Encontramos no Rito Anglicano para a Ordenação ao Diaconato, as funções e deveres do Diácono/a, os quais ele/a se comprometem, diante de Deus e da congregação presente, a cumprir. Com o rito de ordenação e a imposição das mãos do bispo e a invocação trinitária, o Diácono/a recebe a bênção de Deus, da Igreja e comunidade para exercer seu ofício.
A parte do Exame Canônico para a ordenação ao Diaconato onde o bispo/a interroga o ordinando discursa:


Bispo N., todo cristão/cristã é chamado/a a seguir a Jesus Cristo, servindo a Deus, o Pai, mediante o poder do Espírito Santo, Deus agora te chama para um ministério especial de serviço, sob a orientação do te Bispo. Em nome de Jesus, deves servir a todos, particularmente os pobres, os fracos, os doentes e os solitários. Como Diácono/a na Igreja, deves estudar as Santas Escrituras, buscando nelas inspiração e orientação para a tua vida. Deves tornar conhecido o amor redentor de Cristo, por tua palavra e exemplo, entre aqueles com quem convives, trabalhas e adoras. Deves interpretar à Igreja as necessidades, preocupações e esperanças do mundo. Hás de colaborar com o Bispo e os presbíteros na adoração pública e na ministração da Palavra de Deus e dos sacramentos e exercerás outras funções a ti atribuídas, de tempos em tempos. Constantemente tua vida e ensino demonstrarão ao povo de Cristo que, em servindo aos desamparados, estás servindo ao próprio Cristo.
N., crês que estás sendo verdadeiramente chamado por Deus e sua Igreja a viver a vida e a obra de um Diácono/a?
Ordinando/a: Nesta persuasão estou.
Bispo: Agora, na presença da Igreja, te comprometes a cumprir com este dever e responsabilidade?
Ordinando/a: Sim, eu me comprometo
Bispo: Respeitarás e serás guiado pela orientação pastoral de teu Bispo?
Ordinando/a: Assim o farei, ajudando-me o Senhor.
Bispo: Serás assíduo na oração, na leitura e no estudo das Sagradas Escrituras?
Ordinando/a: Assim o farei, ajudando-me o Senhor.
Bispo: Procurarás sentir a presença de Cristo nos outros, dispondo-te a ajudar e servir aos necessitados?
Ordinando/a: Assim o farei, com a ajuda de Deus
Bispo: Procurarás, da melhor forma possível, moldar a tua vida e a de tua família de acordo com os ensinamentos de Cristo, de modo que sejas um exemplo salutar para o povo de Deus?
Ordinando/a: Assim procurarei, ajudando-me o Senhor.
Bispo: Procurarás, em tudo, não a tua glória, mas a glória do Senhor Jesus Cristo?
Ordinando/a: Assim o farei, com o auxílio de Deus.
Bispo: Que o Senhor, pela sua graça, te sustente no serviço que Ele te confia.
Ordinando/a: Amém.


O Exame Canônico para a Ordenação ao Diaconato demonstra as funções, deveres e atributos do ordenando ao diaconato: Servidor ao desamparado e fraco, submisso ao Bispo e Presbítero/a, assíduo na oração e estudioso das Sagradas Escrituras, assim ele deve:
Servir com sua vida a Santíssima Trindade;
Ser orientado pelo Bispo;
Servir a todos, particularmente os pobres, os fracos, os doentes e os solitários;
Estudar as Sagradas Escrituras para buscar orientação e inspiração para sua vida;
Pregar a Palavra de Deus, tornando conhecido o amor redentor de Cristo, por palavra e exemplo;
Colaborar com o bispo e os presbíteros na adoração pública, ministração da Palavra de Deus e Sacramentos;
Exercer outras funções que porventura possam ser atribuídas;
Servir aos desamparados como ao próprio Cristo.
Moldar a própria vida e da família de acordo com os ensinamentos de Cristo.
O Bispo e o Presbítero não pode estar em todos os lugares ao mesmo tempo e nem agir em todos os segmentos, tornando assim o papel do diaconato permanente fundamental para o bom andamento da comunidade de fé.
Quais os ministérios específicos que o Diácono Permanente pode desenvolver
Em uma sociedade opressora, a Igreja é chamada a ser testemunho de Cristo que está entre nós como quem serve. É nesse contexto que o Diácono/a Ordenado Permanente pode exercer seu ministério de servir a todos, particularmente os pobres, os fracos, os doentes e os solitários, pois
Los diaconos representan en el seno de la Iglesia su vocácion de servidora en el mundo. Sosteniendo en nombre de Cristo un combate entre las innumerables necessidades de la sociedade y de las personas, los diáconos dan ejemplo de la interdependencia del culto y y del servicio en la vida de la Iglesia. Ejercen una responsabilidad en el culto de la comunidade. (Bautismo, Eucaristia, Ministério)
É importante ressaltar que os ministérios desenvolvidos surgem em respostas às necessidades locais e históricas do qual o Diácono/a está inserido. A Partilha teológica nº 7 sobre O Ministério do Diaconato, realizado em Brasília – DF em maio de 1998 afirma que os ministérios diaconais surgiram em resposta às necessidades específicas de nossas sociedades e que são frequentemente expressões de realidades particulares históricas e culturas. Enquanto liamos esse trecho passava por nossa mente: Quais os ministérios específicos, conforme a necessidade, o Diácono/a permanente pode desenvolver dentro de nosso contexto histórico, além daqueles já previstos: o de ser um auxiliar do Bispo ou Presbitérios/as e cumprir suas funções litúrgicas, como por exemplo: ler as Escrituras, batizar, pregar e distribuir os elementos da Eucaristia?


Procuramos logo a seguir elencar alguns deles, mas tendo consciência que não são definitivos, porque, segundo a necessidade local e histórica, podem surgir outros:
- Ministério junto aos Sofredores de Rua: Esse é um ministério do Diácono/a Permanente que reside nas cidades, pois num mundo excludente centenas de pessoas, por motivos variados acabam por encontrar nas ruas sua morada. A ação se faz necessária para levar conforto espiritual e material para aqueles que estão sem um teto para morar.
- Ministério da Educação: Em um país onde ainda há analfabetos e crianças com dificuldades de leitura e interpretação de textos e portanto excluídos, a atuação do Diácono/a Permanente pode ser primordial para diminuir esses índices com programas de alfabetização e reforço escolar.
- Ministério junto às mulheres vítimas de violência: Em nossa sociedade dezenas de mulheres são vítimas de violência. A maioria dos casos são maridos que espancam suas mulheres, outras vezes patrões que assediam suas empregadas. A atuação da Igreja através do Diácono/a Permanente é fundamental, pois ele/a pode atuar levando conforto espiritual e psicológico, além de orientar essas mulheres quanto aos seus direitos legais.


Ministério junto aos encarcerados: O Sistema Penitenciário Brasileiro é um depósito humano que deveria ter a função de recuperar seus presos, mas não o faz. Há cadeias superlotadas, com condições subumanas de vida e verdadeiras “escolas do crime”. A atuação do Diácono/a Permanente pode ser no sentido levar conforto espiritual, psicológico e encaminhamento legal.
Além desses, a ação da Igreja é necessária em defesa do meio ambiente, da criança e adolescente, dos animais, etc.
A partilha nº 07 sobre o Ministério Diaconal nos alerta sobre questões fundamentais quanto a atuação da Igreja na diaconia social e política:
1ª - A Igreja não está suplementando deficiências do Estado, mas sim atuando como proclamadora do Reino de Deus mediante gestos significativos, gestos expressivos do carinho de Deus que ampara e reconstrói pessoas e julga o pecado do mundo. Exatamente como fez Jesus em sua atuação em favor do enfermos, marginalizados, dos empobrecidos e dos abatidos e por esses sinais anuncia-se de maneira palpável um novo mundo possível. São sinais proféticos. A diaconia do Reino é essencialmente profética. Ao agir em prol dessas pessoas em nome de Jesus, a Igreja ajuda a fazer a passagem da escravidão à liberdade, da alienação à humanização; e assim já está sendo agente portadora da boa-nova que restaura e transforma.
2ª - Há um perigo a ser reconhecido no sentido de que tais ministérios podem tornar-se locais onde grupos marginalizados podem ser isolados e confinados. Os ministérios diaconais com um foco específico não devem ser estruturados de modo que reforce estereótipos opressivos. A ação diaconal, que anteriormente está identificado com um grupo deve estar abertos para outros. Por exemplo, as formas de atuação consideradas apropriadas as mulheres podem ser adequadas também para os homens, que porventura sofram situações de violência.
conclusão
No corpo desse trabalho afirmamos que a igreja existe para servir a Deus, a humanidade e ao mundo. Faz parte da própria identidade da Igreja exercer diaconia. Eu vim para servir disse Jesus (Mt 20.28), ou ainda, eu estou entre vocês como aquele que serve (Lc 22.27). Os cristãos e cristãs são servos uns dos outros e de todos o encontrados pelo caminho. É interessante que os próprios discípulos têm dificuldade para entender que o maior é aquele que serve. Ao vocacionar seu povo para o serviço diaconal, Deus quer que sua Igreja cresça e se desenvolva em amor.
Mesmo reconhecendo que todos e todas são chamados a servir a Deus e ao próximo, a igreja ordena alguns de seus membros para o Santo Ministério em nome de Cristo, pela invocação do Espírito Santo e imposição das mãos. Lemos em Efésios que “Deus escolheu alguns para serem apóstolos, outros para profetas, outros para evangelistas, e ainda outros para pastores e mestres… a fim de construir o corpo de Cristo (Ef 4.11-12).
A Igreja Episcopal Anglicana do Brasil reconhece o tríplice ministério ordenado: O/A Bispo/a, o/a presbítero/a e o/a diácono/a. Cada um exercendo uma função, para que a Igreja seja verdadeiramente diaconal, porém, é fundamental trazer a mente que todos eles/as são diáconos/as e servem a Deus e ao próximo.
Dentre os ministérios ordenados, o papel do diácono é o que mais recorda a vocação da Igreja servidora. A Partilha de nº 07 afirma que:
na prática da Igreja antiga, diáconos e diaconisas são encarregados, em nome da Igreja, de prestar socorro aos pobres e abandonados, de levar-lhes o consolo da Igreja como resposta a suas necessidades, e de trazer para o interior da Igreja o lamento dos pobres, para despertar sua consciência e ação”
É no contexto de uma sociedade opressora que a ação do diácono se faz necessária, pois além de servir aos bispos e presbíteros, às mesas, batizar, pregar… ele/a deve servir ao mundo e a humanidade, como se servisse ao próprio Cristo (Mt 25.35-40). Em seu trajeto encontrará os pobres, desamparados, solitários, oprimidos. O diácono/a deve ser visto como aquele/a que tem um ministério junto aos que sofrem os atos de uma sociedade injusta, cruel, que necessita da presença renovadora da Igreja, esta é luz (indica a direção) e sal (dá sabor, sentido para a vida).
O Rev. Leandro lembra que:
O Diácono é um símbolo vivo para a igreja e o mundo. A ordem diaconal é a presença do próprio Jesus que veio entre nós para servir e não para ser servido.
Outro ponto importante é que o diaconato não pode ser visto como um simples trampolim para o presbiterato, mas como ministério específico, o servidor das mesas, por essa razão, a Igreja tem a necessidade de pessoas que sintam-se chamadas para o diaconato permanente, e exerçam seu ministério junto aos sofredores de rua, mulheres vítimas de violência, encarcerados e na defesa do meio ambiente, da criança e adolescente, dos animais, etc. A diversidade de necessidades são imensas.
Seja qual for o campo de sua ação, o diácono permanente deve “compreender que a humanidade inteira vive escravizada e que a finalidade da ação de Deus em Cristo é libertá-las dessas cadeias” (O Ministério Cristão – ASTE .p.21).
Há uma necessidade do reavivamento da figura e papel do diácono. Por essa razão:
Nossa diocese e Província é chamada a retomar com todo o vigor a discussão sobre o Ministério do Diaconato (…).
Escolas Diaconais Diocesanas, encontros diocesanos/provinciais regulares dos Diáconos/as, e o reconhecimento dos diversos ministérios diaconais ordenados e não ordenados, mas presentes na igreja que a enriquecem tornando-a uma Presença Libertadora na sociedade e no mundo – à imagem de Nosso Senhor Jesus Cristo. (CAMPOS, Leandro Antunes, Ministério do/a Diácono/a na Perspectiva do Livro de Oração Comum).


referências bibliográficas


BAUTISMO, EUCARISTIA, MINISTÉRIO, Convergencias doctrinales en el seno del Consejo Ecuménico de las Iglesias, Ediciones de La Facultad de Teologia de Barcelona,s/d.


CAMPOS, Leandro Antunes, Ministério do/a Diácono/a na Perspectiva do Livro de Oração Comum, Monografia, UMESP, 2007.


CÂNONES GERAIS DA IGREJA EPISCOPAL ANGLICANA DO BRASIL, Igreja Episcopal Anglicana do Brasil, 2000.


DIDAQUÉ, Catecismo dos Primeiros Cristãos, 4ª Ed. VOZES, Petropólis, 1983


DIACONATO NO BRASIL, Teologia e Orientações pastorais, Estudos da CNBB, Edições Paulinas,1988


IGREJA EPISCOPAL ANGLICANA DO BRASIL, Livro de Oração Comum: Porto Alegre, 1950.


O MINISTÉRIO CRISTÃO, Guia de Estudos, ASTE, São Paulo, 1979.


O MINISTÉRIO DO DIACONATO, IEAB, Centro de Estudos Anglicanos, Partilha Teológica nº 07, Brasília, 1998.


RELATÓRIO DE VIRGÍNIA, Comissão Inter-Anglicana de Teologia e Doutrina, Igreja Episcopal do Brasil.


TRIANA, Pedro, Missão, Evangelização e diakonia, Palestra apresentada na Jornada teológica do IAET, 11-13 de julho de 2008. Casa Provincial La Salle. Site do CEA.


UM SÓ BAPTISMO, UMA SÓ EUCARISTIA E UM SÓ MINISTÉRIO RECONHECIDOS, Documento da Comissão de Fé e Ordem do Conselho Mundial de Igrejas, Documento nº 73, Genebra – Suiça, 1975

Missões num Mundo Globalizado (Jorge de França Souza)

MISSÕES NUM MUNDO GLOBALIZADO

Disciplina: Evangelização
Mestre: Dr. Pedro Triana
Seminarista: Jorge de França IAET – Instituto Anglicano de Ensino Teológico
Segundo Semestre / 2007

Quando escolheu os 12 apóstolos, em nenhum momento Jesus perguntou se eles queriam segui-lo, simplesmente disse: ”vinde após mim e vos farei pescadores de homens”. Nos dias atuais acontece da mesma forma e independe de nosso querer. Muitas vezes percebemos os sinais, porém não vislumbramos o chamado divino.

Às vezes precisamos nos questionar: - Como seguir a Cristo e qual a maneira mais eficaz de servir este povo esquecido pelas elites dominantes, com o mesmo exemplo de Jesus que lavou e beijou os pés dos discípulos?

Hoje no mundo globalizado, individualizado, fragmentado e relativista, como podemos fazer para que o evangelho seja propagado àqueles que ainda estão distante das promessas da boa nova?

Para termos embasamento aos nossos questionamentos é preciso voltar ao passado e sentir no íntimo os ensinamentos do Mestre e analisar como era o comportamento e as atitudes dos primeiros cristãos e procurar entender, ao longo da história, o verdadeiro significado da missão.
Durante os 30 anos em Nazaré, Jesus trabalhava na roça e prestava serviço ao povo como carpinteiro. Eram tempos difíceis, pois o Império Romano dominava a Palestina e explorava o povo através dos impostos altíssimos (mera coincidência com os dias atuais) e trabalhos forçados (Segundo dados da projeto Milênio da O.N.U., feito em 2002, há mais pessoas escravas hoje do que no auge do período em que a prática era legal). A estimativa é que entre 13.7 e 37 milhões de pessoas trabalhem em condições de escravidão).

A história nos mostra que quando Jesus ainda era um menino de 7 anos, a repressão romana atacou e destruiu a capital da Galiléia, chamada Séforis, que ficava a sete quilômetros de Nazaré. A população inteira foi morta ou escravizada. Após alguns anos, quando Jesus já era adulto, o rei Herodes mandou construir uma nova capital à qual deu o nome de Tiberíades para honrar a Tibério, o imperador de Roma. Lá moravam os grandes da corte, os oficiais e os cidadãos importantes da Galiléia. Os pobres, o povo da roça, sofriam muito. Eram marginalizados de tudo, excluídos e às vezes executados sem processo, como aconteceu com João Batista. Os recenseamentos freqüentes eram apenas para saber quanto cada família tinha de pagar de tributo e de imposto. Os estudiosos calculam que mais da metade do salário de um pai de família ia para os impostos, tributo, taxas e dízimos.

E a religião, o que fazia para ajudar o povo? A religião oficial dos escribas e fariseus, dos saduceus e sacerdotes não dava muita atenção a esse sofrimento do povo. Em vez de ajudar o povo a resistir e não perder a esperança, insistia quase só na observância da normas rituais da lei, nas práticas do culto e na pureza da raça. Em vez de animá-lo, ameaçava em nome de Deus com castigo e pecado. Em vez de diminuir, aumentava a exclusão, ensinando que deficientes físicos, doentes, gente com defeito corporal, estrangeiros, mulheres e tantos outros não podiam participar plenamente na vida da comunidade.

E foi neste ambiente que Jesus começou sua vida pública, sua missão. A esperança do povo realizou-se em Jesus que disse assim : “Eu sou o bom pastor”. E foi com ternura, bondade que Jesus começou a ensinar para o povo. Impressionava a acolhida e a bondade de Jesus para com as pessoas, sem distinção de raça, credo, ou posição social. A sua grande preocupação era aliviar a dor do povo sofrido.

Como servo do Pai, anunciado pelo profeta Elias, Jesus se colocava em oração diante de Deus para assim encontrar palavras de conforto para o povo desanimado..

A pregação de Jesus atraia muita gente. Ao redor, começou a nascer uma pequena comunidade. Primeiro eram duas pessoas, depois mais duas e estas chamaram outras, depois aumentou mais 12 quando Jesus escolheu os apóstolos e logo já eram 70. E quando os enviava em missão, eram sempre dois a dois. Este ambiente de fraternidade ao redor de Jesus já eram um ensaio do Reino. Não era fácil viver em comunidade. As divisões da sociedade entravam para dentro da comunidade ao redor de Jesus. Por exemplo, Mateus era um publicano que colaborava com os romanos. Simão era do movimento dos Zelotes ou Cananeus que combatiam os romanos. Seria como chamar, nos dias atuais, pessoas de extrema direita e outras de extrema esquerda para formarem uma só comunidade.

Na época eles brigavam entre si para saber quem era o mais importante. Mas Jesus insistia para que aprendessem a conviver em comunidade.
Depois da ressurreição, entre os primeiros cristãos, também houve divisões: “Eu sou de Paulo; Eu sou de Pedro; Eu de Cristo”. Uns queriam manter as observâncias do antigo testamento, outros queriam agir com mais liberdade. Por causa disso Paulo enfrentou Pedro publicamente.
Daí, percebe-se que não havia unidade, as origens do cristianismo são na verdade pluralistas. Pedro era Judeu, Paulo era gentio. As visões teológicas eram diferentes. Outro erro é esquecermos que houve também missões para outros lugares, inclusive para a África (Atos 8:26). Só que a nossa visão de cristianismo foi puramente ocidentalizada.

Enfim, as estruturas da Igreja surgem em momentos tensos e de transformações políticas, além é claro, das perseguições por parte do império romano. E mesmo com as divergências e as perseguições, pela ação do Espírito Santo eles conseguiram propagar a boa nova aos quatro cantos do mundo.

No início, a relação entre os cristãos e o Império Romano foi de hostilidade. Já no ano de 68, o imperador Nero decretou uma perseguição sistemática contra eles, ceifando a vida dos primeiros pregadores. Até o início do século IV, muitas outras perseguições se sucederam, e milhares de adeptos foram sendo eliminados em diferentes épocas e lugares, alternando-se com períodos de paz. A acusação era de descrença por não adorarem os deuses de Roma, nem admitirem a divindade do Imperador. Pelo Édipo de Milão, no ano de 313, o imperador Constantino concedeu a liberdade religiosa (como se revelara inútil pretender sustar o crescimento do cristianismo, era mais vantajoso fazer dele uma religião oficial). Para quem fora perseguido, era maravilhoso. O triunfo do Cristianismo fez com que a igreja desabrochasse. Os Bispos tornaram-se personagens centrais em cada cidade. Foram chamados “pontífices”, nome dado aos sacerdotes romanos.

Nos dias atuais, é preciso repensar o verdadeiro sentido da missão. Ser sacerdote num mundo globalizado, cheio de imprevistos, de incertezas e inseguranças, numa identidade sacerdotal nem sempre clara e numa missão conflitiva e exigente, pode colocar medo em muita gente. Aos mais corajosos estas dificuldades desafiam e convidam a tomar cada vez mais consciências do valor do sacerdócio que, como tesouro, carregamos num vaso de argila e todo cuidado é pouco para que o vaso não se quebre. Mas ser sacerdote sempre será e é uma aventura de fé, de amor e de esperança. É Jesus que tendo entrado na vida não pode mais sair, e que nos impulsiona com força para sermos profetas, missionários anunciadores dos valores do reino que somente será capaz de criar uma sociedade nova e um mundo em que o ódio, a ganância e o egoísmo não poderão ter direito de existir.

Ser sacerdote de qualquer “Jeito” sempre foi fácil, afinal, parece ser uma vida confortável e cômoda, mas ser sacerdote segundo o coração de Cristo, ser bom pastor como os profetas sonharam e o Cristo realiza plenamente, é sempre exigente e obriga a sair de si mesmo para tomar a cruz do Senhor Jesus e caminhar de cabeça erguida.

O sacerdote deve ter a certeza que é um “cordeiro” enviado no meio de lobos e não pode dar tréguas aos lobos que tentam arrebatar, estraçalhar, ferir e destruir o rebanho. Ele sabe que a sorte do rebanho será também a sua, que a morte de Cristo, bom pastor, na cruz, será também a sua. Também precisa entender claramente que a missão não é sua e sim de Cristo. Ele é apenas um instrumento.

Mas será que é só isso? É preciso ter em mente que algumas mudanças precisam ser feitas. O modelo de evangelização utilizado pelos primeiros evangelizadores, apresentava-se nos moldes de Jesus de Nazaré como um processo inculturado, ou seja, exigia-se um esforço para pensar e agir a partir da realidade cultura dos seus simpatizantes. A dimensão cultural não foi rejeitada, mas sim inclusa na perspectiva dessa evangelização. A tentativa propunha a dimensão do sagrado na convivência do dia-a-dia, sem instituir uma prática desrespeitadora dos primitivos valores de cada segmento.

Nos 500 anos de evangelização católica na América Latina, diversas falhas foram apontadas, principalmente sobre a precipitada condenação dos deuses dos povos indígenas e africanos. A evangelização colonial, por exemplo, não se assentou sobre o amor de Deus aos povos, mas sim, solidária aos atos do colonizador e na transposição de uma fé alheia a dos colonizados.

Atualmente se fala que as Igrejas tradicionais, devem re-situar-se no cenário moderno brasileiro, adaptar sua linguagem, atualizar seus métodos e desdobrar seu ardor missionário, atualizar o discurso bíblico, teológico e eclisiológico, re-atualizar as estruturas que limitam e restrigem, re-atualizar nossa tradição litúrgica (refletir o dia-a-dia da comunidade) e atualizar nossos modelos de ministérios. Mas só isto não basta para que ocorra uma evangelização verdadeiramente inculturada. A inculturação não pode ser entendida apenas como uma estratégia de evangelização, um novo marketing religioso. No processo de evangelização, a inculturação já implícita na vida dos povos, de alta dinamicidade, deve ser aceita e preservada. Esse processo não é só uma questão cristã, mas inter-religiosa e ecumênica, pois nos coloca diante do pluralismo religioso a ser respeitado.

Os desafios são grandes, mas precisam acontecer. Os dias em que vivemos são complexos e repletos de desafios. Nas áreas política, empresarial e institucional existe a expectativa de que os líderes sejam ao mesmo tempo íntegros, competentes e dinâmicos. Essa expectativa também se verifica no meio religioso, mas com um diferencial. Os ministros devem prestar contas de seus atos não somente aos seus paroquianos, mas principalmente àquele que os vocacionou e capacitou para o seu nobre ofício – O próprio Deus.

Numa época em que o trabalho pastoral se torna uma atividade entre outras, em que os ministros correm o risco de serem meros “profissionais do púlpito”, em que motivações secundárias ou menores buscam a supremacia no coração dos presbíteros, vale a pena ouvir a exortação de Paulo ao seu colega mais jovem:
“Cumpre cabalmente o teu ministério”(2 Tm 4,5).

Bibliografia

MESTERS, Carlos & OROFINO, Francisco. “Seguir Jesus”. SP:Paulus, 2006.

Revista bimestral “Vida pastoral”. SP:Paulus, 2007. Nº 257.

<http://www.dasp.org.br/codigos/artigos/evangelizacao_e_%20renovacao_do_anglicanismo.htm>, visitado em 16 jan. 2008.

<http://www4.mackenzie.com.br/7101.html>, visitado em 17 jan. 2008.

CREMOS NO ESPÍRITO SANTO (Jorge de França Souza)

CREMOS NO ESPÍRITO SANTO

Disciplina: Estudos Teológicos
Mestre: Revdo. Dr. Calvani
Seminarista: Jorge de França IAET – Instituto Anglicano de Estudos Teológico
Segundo Semestre / 2008

Entender a ação do Espírito Santo em nossas vidas nunca foi mistério em minha vida. Desde cedo minha mãe já nos ensinara a fazer o sinal da cruz.

Até hoje ainda me lembro de sua citação “Pelo Sinal da Santa Cruz, livrai-nos Deus, Nosso senhor, dos nossos inimigos, em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo”, enquanto com o polegar direito desenhava uma cruz invisível em minha testa e na dos meus irmãos.

Nunca questionei de onde ela aprendera, mas penso que foi passado pelo meu avô que fora criado pelos Padres Jesuítas após ficar órfão quando a fazenda da família foi queimada pelos escravos durante a libertação.
Hoje sei que há diversas correntes teológicas sobre a ação do Espírito Santo, mas penso que a ação não é uniforme e se dá de forma variada para cada ser.

Nos estudos teológicos, aprendi que o Espírito Santo é o agente do relacionamento entre Deus e o homem. É por isto que os autores do Novo Testamento o descreve como Pneuma, o vento.

Jesus foi o primeiro homem a receber a plenitude do Espírito, ou seja, o Espírito foi a dinâmica que impulsionou todo o seu ministério aqui na terra. Para nós Anglicanos, o Espírito Santo é a terceira-pessoa da Santíssima Trindade ou, seja é Deus operando continuamente no mundo e na Igreja(Jo 16,.7-8)”.

O Adjetivo “Santo” atribuído ao Espírito não tem a ver com as qualidades morais como costumamos às vezes pensar. A antropologia cultural tem nos ajudado a compreender que tal expressão tem muito mais a ver com qualidades que nos levam ao deslumbramento e ao louvor. “Santo”, nas Escrituras e em tantas outras religiões é aquilo que está “separado” do comum, que é fascinante e totalmente diferente de tudo o que conhecemos. Porém, tal separação não é radical, pois o Espírito se relaciona com o universo na condição de ser “Doador da Vida”.
A palavra “Espírito”, em hebraico é de gênero feminino (Ruah). No grego, é neutro e no latim, masculino.

Tais diferenças levaram os redatores do documento “A Confissão da Fé Apostólica” a dizer: “Porque o termo empregado para designar o Espírito de Deus (Ru’ah) pertence no hebraico e nas línguas correlatas ao gênero feminino, algumas pessoas acham que o Espírito Santo deveria ser considerado, de certa maneira, uma espécie de ‘princípio feminino’ de Deus, e que, portanto, deveria ser tratado como ‘ela’. As igrejas, no entanto, afirmam o imaginário das Escrituras com suas analogias simbólicas e sua linguagem metafórica, mantendo o uso tradicional que prefere o gênero masculino ou, em algumas línguas, o neutro”.

Confessar a fé em um só Deus e em seu Filho Jesus Cristo, é confessar também a fé no Espírito Santo, porque é por meio do Espírito Santo que conhecemos Jesus Cristo e o plano de Deus para conosco (Jo 16.12-15; 1Co 2.10-16).

Foi por meio do Espírito Santo que Deus preparou a vinda do seu Filho ao mundo, desde a antiga aliança. Por isso, o Credo Niceno frisa: “o qual falou pelos profetas”.

Desde o século XVII este símbolo é conhecido como niceno-constantinopolitano. De fato, ele retrata a fé expressa nos dois Concílios de Nicéia(325 d.C) e de Constantinopla(381d.C).

O Concílio de Nicéia acentuou a identidade da natureza entre Deus e Nosso Senhor Jesus Cristo, Filho de Deus. Ele apenas afirma que crê no Espírito Santo sem nenhuma explicitação.

O Concílio de Constantinopla definiu, por sua vez, a divindade do Espírito Santo. No Século VI, foi adotado, em grande parte do Oriente, como Símbolo batismal e introduzido também na Liturgia eucarística. E até a reforma litúrgica do Vaticano II, era a única forma de Credo que se rezava. Atualmente continua optativa juntamente com o Símbolo chamado apostólico.

A diferença entre os dois Símbolos acena para duas perspectivas teológicas. O Símbolo apostólico, romano, mais sucinto, acentua os aspectos históricos e concretos da vida de Jesus. O texto foi fixado no século IX, oriundo das catequeses batismais do século II.
Santo Ambrósio no século IV atribuiu-lhe o nome de Símbolo dos Apóstolos, por refletir a fé da Igreja dos apóstolos. O Símbolo “niceno-constantinopolitano” espelha a mentalidade grega, filosófica e abstrata. Responde com posição dogmática às chamadas heresias que ameaçaram a Igreja nos quatro primeiros séculos.

Diferentemente de Deus(Pai) e de Jesus Cristo(filho) o Espírito Santo não fez nenhuma revelação de Si. O Antigo testamento assistiu ao processo de auto-manifestação de Javé que através de grandes prodígios assumiu a iniciativa de revelar-se ao povo que Ele mesmo escolheu.

Quando Jesus veio, nomeou Deus como Pai e no Evangelho de João, chamou a si mesmo de Filho, em profunda unidade com o Pai.
Deus Pai auto-comunicou-se em eventos e palavras. Jesus, por sua vez, foi todo revelação por meio de sua pessoa, mensagens e ações.
Já o Espírito Santo não fez nenhuma revelação de si. Não falou, não escreveu, não agiu visivelmente na história como Espírito Santo.
Muitas pessoas agiam de maneira extraordinária e os escritores sagrados foram falando da ação do Espírito. Associavam os sinais de vida à ação dele.

Pouco a pouco, chegamos à pessoa do Espírito Santo, perguntando-nos quem podia ser aquele que agiu desde a criação do mundo até a animação da vida cristã e da Igreja? Seria a simples presença do Pai? Seria a nova forma de Jesus fazer Ele mesmo o presente? Diante de tais perguntas, a revelação e a teologia foram explicitando a fé no Espírito Santo até chegar à clareza de se tratar de uma pessoa divina igual ao Pai e ao Filho. Ao olharmos atentamente para os primeiros escritos da bíblia no livro do Gênesis, percebemos no Espírito de Deus, que pairava sobre as águas(Gn 1.2) que não se tratava de simples sopro ou ventania produzido por Javé. Ou então quando Isaías, falando do juízo de Deus, ao aludir a idéia da criação, desafia quem tomou a dimensão do “espírito de Javé(Is 40,13)”: quem seria este espírito de Javé, senão o próprio Espírito Santo?

Em outras passagens, o espírito dá vida aos seres:
“Escondes a face, e estremecem; se retiras o seu alento(espírito), morrem e voltam ao pó. Envias o teu alento(espírito), morrem e voltam ao pó. Envias o teu alento(espírito), e são recriados, e renovas a face da terra” (Sl 104,29-30).

No Êxodo, em ação tão simples, mas sagrada, como a confecção das vestes litúrgicas sacerdotais, Deus dota os artistas de “espírito de sabedoria (Ex 28,3)”. No sentido simples e imediato, está em jogo naturalmente habilidade prática, mas, como dom de Javé, deixa aberta a compreensão para a ação do Espírito.

Pela imposição das mãos de Moisés, Josué se enche do “espírito de sabedoria (Dt 34,9)”, que, ao simples soar das palavras, se interpreta como dom concedido por Javé, mas a releitura cristã percebe mais. O mesmo vale do espírito que suscita juízes para libertar as tribos de opressões concretas.

Assim quando os Israelitas se encontravam sob o poder do rei de Aram, “o Espírito do Senhor veio sobre Otoniel que foi Juíz em Israel. Quando saiu para a guerra o Senhor lhe entregou Cusã-Rasataim, rei de Aram, e Otoniel. O país ficou em paz durante quarenta anos, até que Otoniel filho de Cenez morreu(Jz 3,10s).

Qual o Cristão ao rezar o salmo 51, expressão tão bonita de arrependimento de Davi e de todos nós, não se deixa tocar pelo versículo que diz:

“Não me rejeites da presença de tua face, e não retires de mim o teu Espírito Santo! (Sl 51,13)”.

Com freqüência, a ação do Espírito desce sobre os profetas, abre-lhes os olhos para profetizar. Balaão o recebe e entra em êxtase(Nm 24,2-4), Samuel, depois de ungir Saul, diz-lhe que Javé o ungiu e o que o espírito de Javé se apossará dele, ele profetizará e será transformado em outro homem(1Sm 10,1.6).

Uma cena muito linda acontece com a instituição de setenta anciões a quem Javé reparte o espírito que estava em Moisés para que eles dividam as responsabilidades do povo. A cena faz um cristão pensar em Pentecostes.

“Moisés saiu para transmitir ao povo o que o Senhor tinha dito. Reuniu setenta homens dentre os anciões do povo, e colocou-os ao redor da tenda. O Senhor desceu na nuvem e falou a Moisés. Retirou um pouco do espírito que possuía e o pôs sobre os setenta anciões. Apenas sobre eles pousou o espírito e puseram-se logo a profetizar, mas não continuaram. Dois homens tinha ficado no acampamento. Um chamava-se Eldad e o outro Medad. O espírito repousou sobre os dois, que estavam na lista, mas não tinham ido à tenda, e eles também profetizavam no acampamento(Nm 11,24-26).

Eliseu pede a Elias uma porção dupla de seu espírito. Apesar de ser coisa difícil, Elias dá-lhe o critério do manto como confirmação do recebimento(2Rs 2,9-10). Sobre o servo de Javé repousa o espírito(Is 42,1), alusão à presença do Espírito em Jesus, o verdadeiro servo de Javé, embora os exegetas, segundo o sentido literal histórico, entendam referir-se a Ciro da Pérsia. E, sobretudo, sobre o profeta está o espírito de Javé que o ungiu(Is 61,1). Passagem que se tornou famosa porque Jesus a aplica a si mesmo(Lc 4,16-21).

Mais um exemplo da vinda do anuncio da vinda do espírito:
“Sairá um rebento do tronco de Jessé, e de suas raízes brotará um renovo. Repousará sobre o espírito do Senhor, espírito de sabedoria e discernimento, espírito de conselho e fortaleza, espírito de conhecimento e temor do Senhor (Is 11,1-2)”. Em leitura duplamente cristã, interpreta-se o rebento como o Messias, Jesus Cristo, em quem repousou o Espírito Santo, e a liturgia e a catequese do sacramento da crisma vêem a enumeração dos sete dons do Espírito Santo. Da lista de Iaías,falta um dom. No entanto, a versão bíblica e da Vulgata acrescentam o sétimo dom da “piedade”, como desdobramento do temor de Deus. Ponto alto da revelação do Espírito no Antigo Testamento. Até então se pensava que fosse simples forma da presença de Javé. E os textos assim foram pensados e escritos, embora abertos á outra interpretação que se fez no Novo Testamento.

A revelação do Espírito Santo na vida de Jesus dá por ocasião do batismo por João Batista que anuncia: Ele batizará no Espírito Santo(Mc 1,4-8). Neste momento está sendo introduzindo o Espírito Santo pela primeira vez no relato da vida adulta de Jesus. E como confirmação da verdade, no batismo de Jesus os céus se abrem e o Espírito desce sobre Jesus como pomba e uma voz que diz: Tu és o meu filho amado, de ti eu me agrado(Mc 1,10-11).

Com a efusão do Espírito Santo começa uma nova era para a humanidade. E o batismo de Jesus sinaliza-a. Pedro, no discurso depois da descido do Espírito Santo, retoma tal texto para interpretar o evento do Pentecostes, que perpetua a era de Jesus principiada no batismo(At 2,14-36).

Uma vez marcada a entrada do Espírito Santo na vida de Jesus, os sinóticos referem-se várias vezes à força do Espírito que o conduziu ao deserto para ser tentado(Lc 4,1) à Galiléia(Lc 14), a reconhecer na alegria a disposição de Deus Pai de revelar-se aos pequeninos(Lc 10,21) e em nome de quem expulsa demônios(Mt 12,28).

Penso que diante das dificuldades atuais, num mundo globalizado e secularizado onde o povo sofrido além da fome física carece da fome espiritual, é preciso que os semeadores se preparem de maneira adequada para o exercício da fé e para isto a oração diária deve ser uma constante em sua vida. Primeiro deve cuidar de si e depois cuidar dos outros. E para isto acho primordial estes parágrafos do texto “A vida espiritual do sacerdote Cristão” escrito por Evelyn Underhill:
“É Certo, naturalmente, que ao falarmos em oração devemos estar alertas à inclinação de pensarmos nela simplesmente como um meio de conseguirmos auxílio de Deus como nos convém. Contudo, para o sacerdote, é ela a única fonte de poder pastoral. Aptidões intelectuais e sociais, boa homilética, capacidade de organização, ajudam muito no seu trabalho. Mas não são essenciais ao desempenho do ministério. A oração o é. O homem cuja vida é semeada de oração e cuja comunhão com Deus vem em primeiro lugar ganhará almas: sua própria vida mostrará ao mundo o poder de atração da realidade, a exigência e a capacidade transformadora da vida espiritual. Em comparação, todas as outras capacidades que possa ter, não são tão importantes. O Fato é que ele se transforma em testemunho daquilo que proclama. Podemos ensinar com muita persuasão, trabalhar entre os pobres, saber toda teologia moderna – mas se tudo isso não vier envolto e não for superado por uma constante devoção a Deus – jamais ganharemos almas.

Bibliografia

Calvani, Rev. Dr. Carlos Eduardo. “Apostila - Cremos no Espírito Santo”.

Eser B.Cesar, Ely. “ A ação humanizadora do Espírito” – AsteLibânio,

J,B. “Creio no Espírito Santo”- São Paulo: Paulus,2008”.

UNDERHILL, Evelyn. “A vida espiritual do sacerdote cristão”.